domingo, 25 de outubro de 2009

O Casaco de Pele


Ésta historinha eu a escrevi em 1999, inspirada numa placa plantada na porteira de uma chácara à beira da rodovia SC 404 que me levava em direção a praia dos Ingleses, onde eu morava. A placa anunciava que ali vendia húmus de minhoca.
A viajem de ônibus do centro da cidade até à minha casa, levava mais de uma hora, mais precisamente; uma hora e quarenta e cinco minutos, daí que não havia mais o que inventar para passar o tempo num ônibus lotado, onde se ouvia todo tipo de conversa, algumas interessantíssimas outras nem tanto, e misturada a esse mar de pessoas empilhadas que falavam o tempo todo, faziam crochê, liam ou dormiam, ia eu e meus pensamentos, duas vezes por semana lendo todas as placas do caminho, o que me irritava profundamente, pois nunca havia nada de novo, inclusive a que anunciava húmus de minhoca, mas eu continuava lendo automáticamente, até o dia que comecei a escrever mentalmente esta história e ao chegar em casa foi só sentar no computador e teclar. Estava pronta mais um dos meus surtos criativos.

O Casaco de Pele



Naná a minhoca faceira, vivia numa fazenda com seus parentes oxigenando a terra.
Iam rastejando de um lado para o outro o tempo todo, fazendo buraquinhos na terra, por onde passava o oxigênio, o ar que respiramos, fazendo com que a terra desenvolvesse lindos girassóis naquele lugar.
Certo dia Naná, foi colocada e levada com suas primas num caixote cheio de terra fofa, para uma exposição ecológica. Naná ficou super animada nunca tinha saído da fazenda para lugar nenhum, no máximo tinha ido até outras plantações ali perto visitar outros parentes que moravam nas plantações de soja, de feijão, de café e de trigo. Eram plantações lindíssimas. Ela pôde ver bem, porque era muito curiosa e espiava para fora da terra de vez em quando. Ela queria muito conhecer o mundo lá fora, passear no shopping, viajar, enfim, sair daquela vida de minhoca. Então quando teve a oportunidade de ir à feira ecológica não cabia em si de alegria e contentamento.
Finalmente chegaram lá e Naná não parava de ir de um lado para o outro de tanta alegria, até parecia que ia explodir de felicidade..
Foi aí nesse vai e vem, no extremo da sua curiosidade que ela resolveu olhar para fora e foi então que o mundo desabou para Naná. É que ao olhar para fora da terra ela tomou um grande susto. Bem ao lado dela, cochilando tranqüilamente num galho de uma planta, estava uma bela e gorda taturana preta. Daquelas bem peludas.
Naná, nunca tinha visto uma taturana em sua vida. Nem de perto e nem de longe.
Seu pai sempre falava de alguns parentes que moravam do lado de fora da terra, mas ela nem imaginava que eram tão LINDOS!!!!
E foi exatamente naquele momento, que Nana a minhoca, foi tomada de um enorme sentimento de inveja e ciúme, sentimentos ridículos e que nem sempre controlamos:
-Mas olha! Veja só; uma minhoca de casaco de pele, que granfina*! E eu que trabalho tanto o tempo todo, não tenho nem um colete ou uma gola de pele até um gorro servia, mas não! A boba da Naná, não precisa dessas coisas. Só precisa trabalhar, trabalhar... Só isso! Não tem serventia para nada. Só cava, só cava o dia todo! É buraquinho para cá, é buraquinho para lá e ninguém valoriza o que ela faz.
Derramando lágrimas sofridas ela voltou rapidamente para dentro da terra indignada sentindo-se a mais reles das minhocas. Suas primas a consolavam de todas as maneiras, mas ela não queria saber de nada. Tristonha e deprimida, não queria saber nem de conversa, ficou lá num canto emburrada, e nem trabalhou mais o restante do dia. Aliais jurou que nunca mais trabalharia.
Quando acabou a feira ecológica, ela voltou para casa abatida, chateada e nada a fazia esquecer o lindo casaco de pele negra que a Taturana usava; chiquíssimo.
O tempo foi passando e Naná nem aí, continuava chateada e nem queria saber de trabalhar mais.
Um dia, foram chegando alguns carros e um ônibus trazendo muitas pessoas e mudando a rotina da fazenda.
Nesse dia Naná muito contra a vontade, pois ainda continuava deprimida, foi colocada na grande caixa outra vez junto com suas primas. Depois a caixa foi levada para um grande galpão onde tinham muitas cadeiras e a caixa foi colocada sobre a mesa e todos que chegavam paravam para olhar a caixa cheios de curiosidade.
Então o dono da fazenda começou a explicar para essas pessoas porque a sua fazenda era modelo;
Era porque aquelas criaturinhas lisinhas e compridinhas, as minhocas, é que eram as responsáveis por tanta beleza. Elas oxigenavam* a terra com seus furinhos e deixavam o húmus, um material produzido por elas que alimentava as plantas tornando-as belas e saudáveis.
Foi nesse momento que o dono da Fazenda pegou a Naná de dentro da terra e delicadamente colocou-a na palma da mão, mostrando-a para os visitantes.
Todos a olhavam com curiosidade e muito respeito.
Naquele momento, Naná ficou curada, encheu-se de orgulho deixando de lado sentimentos negativos e tão feios como a inveja e o ciúme que não levam a nada porque entendeu que ela a Naná, era uma criatura muito importante para a humanidade*, porque com a sua ajuda não era necessário usar agrotóxicos* e poluir a terra produzindo assim, alimentos mais saudáveis, bonitos e mais gostosos.                 
E foi feliz para sempre.

Os direitos autorais desta e de TODAS as minhas histórias são registradas na Biblioteca Nacional no Rio de Janeiro

4 comentários:

  1. Olá Dona Clotilde ! Tudo bem ?

    Vim retribuir a visita e o comentário tão gentil, foi tão bom ler "jovem mãe", apesar de ser jovem mesmo, as vezes me sinto envelhecida, por tantos compromissos, pela correria do dia-a-dia e por que estou perto dos meus 3.0, não é nada demais, sei que a expectativa de vida é um pouco mais do que o dobro, mas quando penso nos meus 15 aninhos, que eu achava que nunca iriam passar, que nunca minha mãe deixaria de pegar no meu pé, e que justamente passou correndo e hoje sou eu, quem pego no pé do meu filhote, e olha que ele nem tem 15 anos, tadinho...
    Enfim, vim retribuir a visita e me encantei com teu blog, adoro ler, tudo bem que depois que meu filhote nasceu, não li nem um livro inteiro sequer, só leio mesmo os materiais para a faculdade e olha lá. E gosto muito de escrever, sempre me dou bem nas redações dos vestibulares e concursos, é onde me saio melhor, na faculdade de letras, que fazia em Dourados/MS também ia muito bem na matéria específica de produção de textos, até me lembro o nome: Prática de Leitura e Produção de Textos, vulgo PLPT, uau !!!
    Adorei o texto da minhoca, genial, a lição sobre a inveja, um sentimento ruim, mas que surge inocentemente, e que dependendo do rumo da vida da gente, pode nos destruir, por que o invejoso destrói a si mesmo, e não ao seu alvo de inveja, já se a nossa auto-estima é elevada e o nosso valor, mesmo que aparentemente pequeno, é reconhecido, o sentimento de inveja se torna bobo e medíocre, afinal, todos nós somos importantes, cada um a sua maneira, com a sua contribuição para o mundo.
    Ufa, deu pra perceber que falo/escrevo demais, esse é meu defeito... kkk (Quer dizer, um deles)
    De qualquer forma, foi ótimo ter conhecido seu cantinho, amei e com certeza voltarei mais vezes.
    Ah, com o tempo vou lendo os textos do arquivo do blog, entre um afazer e outro, entre o curso e a faculdade.


    Beijinho, mil felicidades pra ti dona Clotilde e toda sua família.


    Aline Marques

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  2. Adorei você (somos parecidas, eu acho), falo um monte e observo tudo. Mas quero lhe dar uma boa notícia; ja sabia Balzac que é depois dos trinta que nós mulhers (sem modéstia nenhuma) ficamos melhores...hahaha.
    Beijos e apareça sempre.♥

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  3. Não tenham cerimônia comigo, me chamem simplesmente de Clô♥

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  4. Marcelo Sguassábia19 de maio de 2015 às 17:18

    Muito bom esse seu texto com jeito de fábula, Clotilde. Um grande abraço pra você!

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