quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Alfabetizado em Braille





                                                     Alfabetizado em Braille
O cara estava olhando uma loja de objetos usados e parou diante de uma maquina de escrever muito estranha. Chamou o dono da loja para saber de que se tratava e ficou sabendo que era uma máquina para escrever em Braille. Negociou o preço e levou o objeto para casa. Entrou na internet e aprendeu como usá-la em poucas lições e passou a escrever coisas e mais coisas.
Certo dia ele teve um grande ideia; ele estava de olho numa vizinha de bairro e ela, mesmo casada não desviava os olhares e nem se fazia de rogada. Assim ele escreveu em Braille uma carta de amor para a referida senhora e enviou pelo correio.
Dias depois ele a encontrou no mercadinho e trocando olhares melosos tentaram uma discreta comunicação entre as prateleiras das azeitonas e temperos.
Enquanto ele examinava um molho de pimenta arretado falou entre dentes para ela:
 - Você recebeu a minha carta?
 - Ah, então foi você quem mandou? Não deu para ler  nada  está tudo em branco e cheia de pontinhos...
 - Pois é, fiz isso com medo que o seu marido a recebesse e as coisas não ficassem boas para o seu lado.
 - Pois é mas como vou entender o que você escreveu? É aquela escrita para cegos, não é? Não conheço nenhum deficiente visual para traduzir a carta, agora é assim que se fala né? Não pode mais falar “cego”...
- Pois é, mas eu acho que valia a pena você aprender a ler em Braille, que é esta escrita em pontinhos, eu comprei uma máquina para escrever, assim a gente pode se comunicar, marcar alguma coisa ...
Nisso apareceu o filho que a acompanhava e os dois despistaram indo cada um mergulhar a atenção em algum artigo.
Passados alguns dias ele recebeu uma carta escrita em Braille e ficou muito emocionado ao ver que a ideia dele tinha dado bons resultados, agora poderia namorar mulheres comprometidas, era a fantasia dele, que ninguém iria descobrir o que ele escrevia.
Abriu nervoso o papel grosso e imaculadamente branco e com dedos trêmulos foi decifrando tropegamente os caracteres em relevo.
"Seu cachorro desgraçado, vai dar em cima da tua mãe!
Se afasta da minha mulher se não quiser levar um tiro na cara, seu vagabundo.

E só para te informar, fui voluntário no Instituto Benjamim Constant por muitos anos e leio e escrevo em Braille, morou?"

terça-feira, 28 de agosto de 2012

Chuva e bolinho de chuva

                                                           Chuva e bolinho de chuva
- Menino! Vá buscar um ovo no galinheiro...
- Mas tá chovendo , mãe.
- Por isso mesmo, vou fazer bolinho de chuva.
- Então eu vou. Os meus eu quero com bastante açúcar e canela, viu?
- Tá bem, tá bem...
E lá se foi o garoto pulando as poças do quintal fazendo respingar nas pernas a lama rala. Entrou no galinheiro e saiu de lá carregando três ovos deixando o galinheiro alvoroçado.
- Pega mãe, só tinha três, vai dar né?
- Vai sim, claro que dá, só bastava um, unzinho só.
Tomou nas mãos os ovos, guardou na fruteira os outros dois entre as frutas e legumes e quebrou o outro numa tigela funda. Colocou os demais ingredientes e colocou óleo numa panelinha funda para aquecer bem.
Foi derramando a massa em bocados e deixou que ela fosse virando e revirando no óleo quente para cozer bem por dentro.  Dai foi retirando um a um e o menino foi espalhando por cima generosamente o açúcar misturado à canela.
Quando terminaram, a água para fazer o café já fervia e foi só coar o pó escuro e cheiroso.
Sentaram-se à mesa e passaram uns minutos em silêncio só apreciando aqueles sabores tão delicados e tão caseiros como o bolinho de chuva com café fresco.
A chuva continuava lá fora molhando a horta e lavando tudo.
Bons tempos aqueles em que pequenos prazeres valiam mais do que o que se compra com dinheiro.

sábado, 25 de agosto de 2012

Dia de sol, dia de bike

                                                     Dia de sol, dia de bike.
O dia acordou feliz, olhei pela janela e o sol já ia alto iluminando e aquecendo tudo amparado pelo céu azul inteiro.
O dia pedia caminhada ou pedalada. Optei pelas pedaladas. Peguei a bike e saí com aquele ventinho bom do deslocamento de ar arejando o rosto e jogando os cabelos para trás, aliais como ouvi de alguém algum dia, sai deitando o cabelo.
Peguei a avenida larga, àquele dia pouco movimentada, e entrei na ciclovia, tomei a direção norte da cidade e fui pedalando, pedalando contra o vento sem lenço e nem documento.
Não pedalei nem três quarteirões e o suor escorria pelas costas seguindo o caminho da coluna dorsal até onde ela termina o que me causou um arrepio agradável, mas o calor tratou de secar rapidamente a liquidez do ânimo.
Pedalei mais um pouco nessa hora já botando os bofes pela boca, o cabelo molhado de suor e revirado pelo vento da velocidade, mas como boa ciclista dos velhos tempos, respirei mais fundo buscando fôlego nas profundezas do velho pulmão e adentrei no horto florestal da cidade em busca de largar a magrela em algum lugar e me estatelar numa grama fofa.
Resfoleguei por horas olhando o céu azul e limpo por entre as arvores.
Tenho certeza que os pássaros riam de mim e da minha fraqueza física tão natural na minha idade, já que só vejo bicicletas em lindas fotos sempre em harmonia com caminhos rústicos e longe do transito infernal do dia a dia, sem falar que não subo numa faz horas.
Uffa! Cansei. Quando resolvi voltar fui carregando o veículo para menores de trinta anos e procurei desesperadamente um taxi, que é claro não encontrei, pois nenhum costuma carregar bicicletas. Andei mais um pouco até uma borracharia e deixei lá minha bike prometendo ao homem que viria busca-la assim que desse e sai de lá atrás de um taxi que me levasse para casa.
Bem, essa é uma história de ficção. A Ligia vive me dizendo que irei visita-la algum dia e que conhecerei Berlim nos pedais de uma bike, dai que isso não me sai da cabeça e resolvi experimentar a ideia, primeiro virtualmente, e vi que eu não tenho mais pique para pedalar nem escrevendo. Então estou fazendo a minha ginastica semanal direitinho para manter as perninhas em condições de fazer pelo menos o equivalente a meio caminho de Compostela...

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Há muito tempo...

                                               Há muito tempo atrás, tanto que nem conto mais...
Um jovem casal se preparava para casar, na verdade ele estava ansioso para casar ela nem tanto, já que o casório foi arranjado como era comum naqueles tempos.
Cada um imaginava como seria o futuro; muitos filhos, também como era comum antigamente, uma casa própria, algumas viagens, alguns passeios e lá ia ele pensando, imaginando, fazendo planos. Ela não. Ela já se imaginava suando no fogão o dia todo, fazendo comida para um batalhão de pessoas, crianças correndo e gritando pela casa, pilhas de roupas para lavar passar e costurar, ufa! Só de imaginar já estava cansada. O sonho dela era ser secretária bilíngue. Datilografar páginas e páginas, vestir saia justa e sapatos altos, camisas imaculadas e casaquinhos escuros, um luxo! Queria ganhar seu próprio dinheiro e até agora só conseguia algum bordando para fora grandes enxovais das mocinhas ricas. Não havia estudado muito, só o suficiente para o gasto.
O noivo era garçom, o melhor do melhor restaurante da cidade, ganhava polpudas gorjetas que guardava para o casamento, mas teria que dar muito duro para conseguirem a casa própria. Pelo menos isso; pagar aluguel uma vida inteira ninguém merece.
Mas ele tinha um grande sonho ou um sonho grande. Queria viajar de navio. E ele pretendia na lua de mel fazer uma viagem São Paulo-Rio. Ele sonhava e imaginava como seria. Eles no convés, o vento sacudindo seus cabelos e o cheiro de mar... Ele sonhava acordado.
Como eram diferentes aqueles dois.
Enfim após dois anos de namoro e três de noivado, havia sempre algum motivo para mudarem a data. Até que o dia chegou e a festa foi realmente linda em todos os detalhes. O vestido havia sido todo bordado a mão por ela mesma.
Saíram da festa por volta das vinte e uma horas e foram num carro de aluguel para a casa onde iriam morar. Lá chegando, romanticamente ele transpôs o portal com ela nos braços. Tudo lindo. Ao entrarem enquanto a colocava no chão ele falou:
- Tenho uma surpresa para você
- Surpresa?
- Sim, amanhã iremos para Santos tomar um navio que nos levará ao Rio de Janeiro. Guardei todas as gorjetas desde que ficamos noivos para realizar este sonho. Tenho certeza que será uma viagem inesquecível mesmo que a gente consiga viajar todos os anos daqui para a frente.
Ela abriu bem os olhos e perguntou:
- Quanto você conseguiu guardar?
- Mais de três contos de reis.
- Mas esse dinheiro dá para a gente dar entrada numa casinha, depois a gente vai pagando o resto com o nosso trabalho.
- Mas a nossa viagem de navio em lua de mel também é um sonho que só pode acontecer agora que acabamos de casar. Temos todo o tempo pela frente para trabalhar, ganhar dinheiro e termos tudo o que quisermos.
- Temos tempo digo eu! Temos a vida inteira para viajar, e agora não vamos gastar esse dinheiro nessa viagem! Eu também tenho umas economias e vamos comprar a casa, ta decidido!
Falou com certa irritação acabando a conversa por ali.
E assim foram transcorrendo anos de poupança para um objetivo, ora para outro que levavam cada vez mais longe o sonho de Aristeu, era assim que ele se chamava, de viajar de navio.
Nasceram filhos, cresceram, e por sua vez casaram, e nada do Aristeu convencer a sua mulher, a Custódia, de viajar. Até que iriam fazer Bodas de Ouro! É, o tempo passou, tudo mudou, Aristeu conseguiu formar uma cadeia de restaurantes, tinha carro, casa de praia e não saia daquela rotina.
A família fazia planos de uma grande festa de bodas. Lista de convidados onde até o prefeito havia sido convidado. Preparativos para todo lado e ele alheio a tudo isso, só olhava um a um, seus filhos, noras, alguns netos que corriam pela casa, muita alegria e ele cabisbaixo, resolveu sair da sala e ir para o quarto.
 As festividades começariam com uma missa em grande estilo, quase um novo casamento.
Na véspera, à noite, Custódia entrou no quarto onde ele já se encontrava deitado entre as cobertas, olhou para o seu marido como há muito tempo não o olhava. Achou-o envelhecido, um tanto abatido, desanimado...
- Meu querido, gostaria de dar-lhe um presente especial no dia de nossas bodas, o que gostaria de ganhar?
Ele meio sonolento respondeu:
- Eu gostaria de uma lua de mel a bordo de um navio, só que agora já não tenho mais tempo...
Virou para o lado e dormiu deixando Custódia parada no meio do quarto sem saber o que dizer relembrando a conversa que tiveram na primeira noite dos dois.
Aristeu nem se deu ao trabalho de acordar no dia seguinte, 27 de maio. O dia em que completaria 50 anos de casado, mesmo dia em que Custódia matou o seu sonho de viajar de navio.

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Enquanto as violetas caem...

                                                 Enquanto as Violetas caem...
 Zelda, no momento com desesseis anos só pensava em ser escritora.
Naquele dia, acordou com aquela obstinação que os jovens possuem, quando querem alguma coisa. E hoje, essa coisa era ser escritora.
Amanhecia quase sempre com uma personalidade diferente, também uma característica da idade. Cada momento uma vida em toda a sua intensidade.
Naquele dia ela apareceu para tomar o café da manhã vestida de calça jeans, camisa, tênis, óculos (que detestava até ontem), o cabelo amarrado num rabo simples e uma pasta na mão. Tudo bem discreto. Tomou o suco olhando para fora da janela completamente “fora do ar”.
Esse comportamento mutante e criativo preocupava muito seus pais. Mas a psicóloga os tranqüilizava dizendo que a adolescência era uma fase e que um dia estas excentricidades iam passar. Só que desde os doze anos ela entrava e saia de uma fase para a outra, sempre com muita determinação.
Para ter ideia quando estivera apaixonada por futebol, acordava e dormia vestida com as cores do time e usava por baixo do uniforme escolar, um uniforme de jogador.
Outra época dizia que seria uma bailarina famosa e vivia na ponta dos pés o tempo todo até que deu uma torção no tornozelo que a deixou com o pé imobilizado tempo suficiente para desistir do intento e até abandonou as aulas de balé.
Outra vez resolveu que descendia de uma tribo de ciganos, e andava vestida a caráter. Via cartas adivinhatórias e vivia lendo as mãos dos vizinhos do prédio onde moravam para diversão de todos. Ninguém estranhava mais essas “novidades” de Zelda.
Hoje ela acordou querendo ser escritora. Saiu à rua, querendo ser escritora. Foi à escola, querendo ser escritora. Era só nisso que pensava. Tinha mil idéias na cabeça. E durante a aula não tirou os olhos do professor a sua frente.
“... todos os que escrevem, colocam no papel seus sentimentos bons e maus. Suas idéias mais profundas ou superficiais. Mas o mais importante é que o que se passa naquele momento dentro de si é a mais pura verdade...”.
E com essa frase o professor de Literatura terminou a aula, deixando Zelda flutuando encantada e mais do que nunca, desejosa de ser uma escritora famosa.
Suspirou profundamente lembrando-se do seu muito amado professor. Sim, era por isso que Zelda queria ser escritora, para que seu amado falasse dos livros escritos por ela com a mesma paixão que ele falava dos escritores durante as aulas. Tinha tanta paixão por ele que até doía. Bebia suas palavras e até chorava com a sinceridade dos seus dezesseis anos, enquanto as colegas riam do seu amor não correspondido.
Naquele dia foi para casa em silêncio, pensando na aula e no que ele dissera; 
“Todos os que escrevem colocam no papel seus sentimentos...”
Quando chegou em casa não quis comer, foi para o quarto e começou a escrever e escrever sem parar, até que dormiu exausta.
Pela manhã o sol a encontrou estendida, atravessada na cama, rodeada de bolas de papel amassado. O semblante calmo e despreocupado mostrava que tinha se apagado mais uma chama forte e luminosa como o sol pela manhã, que iria fazer parte das experiências e lembranças daqueles que conseguem viver a cada momento uma curta mas sempre intensa,  paixão de adolescente.
Numa folha de papel ao lado dela estava escrito:
                                Enquanto as violetas caem...
 
 Enquanto as violetas caem sobre a relva fresca,
Após o vento arranca-las da cesta que carrego nos braços,
Saí pisando com os pés molhados
Da água do regato que passava ao meu lado.
O sol se põe lá longe...
Como eu gostaria de ir com ele para onde ele vai...
O vento passeia por mim ligeiramente
Com a pressa de quem vai em busca da felicidade...
Os pássaros em algazarra dão o recital do fim de tarde.
E lá vou eu passo a passo
A caminho do horizonte...
O lugar que me cabe como moradia como o estado de ser e de estar.
Lá vou eu... As violetas rolam por algum tempo
Ao meu lado carregadas pelo vento
Que me devolvem o seu perfume.
E eu sigo o meu caminho...

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Sombras da noite


                                                             Sombras da noite.
Robertina resolveu fazer a corrida habitual depois das dezessete horas, ao por do sol.
Escolheu para variar, o bosque da cidade. Penetrou por uma picada estreita e embrenhou-se mato adentro, querendo sumir no mundo.
Já estava cheia da rotina da sua vida; trabalhar, trabalhar e trabalhar, sempre servindo a todos o tempo inteiro. Resolveu sair para correr. Só se distraia vendo televisão, aproveitava até enquanto passava a roupa.
Enquanto corria as lágrimas desciam pelo seu rosto marcado pelo tempo. Estava muito triste naquele dia. 
Sua bermuda e suas meias já estavam cobertas de carrapichos, as canelas já estavam marcadas por arranhões e ela não pensava em parar mesmo sentindo o manto da noite cair sobre si. Uma fúria desesperada tomava conta do seu ser. 
Por um momento pensou que se não cruzasse nenhum caminho e nem se desviasse do que ia indo não se perderia e continuou até chegar numa clareira.
Parou resfolegando e abaixou-se com as mãos nos joelhos para recuperar o fôlego, foi ai que sentiu alguma coisa estranha, um zumbido fino dentro do ouvido, parecia que só ela poderia ouvir aquele som estranho, um segundo depois foi coberta por uma luz intensa e caiu de joelhos de susto e medo.
Não queria abrir os olhos, mas teve que admitir que cedo ou tarde era preciso, então que fosse logo. -Ui, quequéisso? – gritou em desespero. – A luz havia diminuido permanecendo uma claridade lunar, azulada, e uma figura estranha havia parado na sua frente. Vestia-se todo de preto e trazia alguma coisa na mão, não sabia se era uma arma, mas era um aparelho pequeno. Ela então caiu de joelhos e chorou por algum tempo sem que a criatura ao seu lado fizesse alguma coisa, apenas a ouviu chorar abaixada sobre si mesma. Não parou de chorar e soluçar até que num determinado momento ela sentiu o seu braço ser tocado e com delicadeza foi levantada vagarosamente, quase interminavelmente. Ela estava tão aflita que se deixou levar mansamente. -Seja o que deusquiser- resmungou entredentes.
Foi andando em direção ao helicóptero que a havia visto na clareira do meio do bosque e resolveu resgatá-la naquela hora da noite.
O que faz ver filme de ficção demais em?

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

T.P.M.


O anjo e o demônio que existe em cada mulher, mais conhecido como T.P.M.
A titulo de curiosidade poderíamos dividir a mulher em dois períodos distintos durante o mês. Melhor falando, dois períodos de quinze dias que definem o anjo e o demônio que existem em nós mulheres.
Num primeiro períodos de quinze dias somos quase perfeitas (isso porque a perfeição não existe neste planeta). Verdadeiros anjos. Compreendemos tudo e todos, fazemos concessões impensadas e às vezes impensáveis. Somos doces angelicais, meiguinhas e muito amigas.  Fazemos comidinhas para uns, sobremesas preferidas para outros. Perdoamos tudo ou quase tudo e justificamos certas situações com tolerância invejável.
Condoemos-nos até as lágrimas com cenas maternais, animais e etc.
Oramos salmos e salmos para a saúde da família e amigos com sinceridade. Somos anjos do bem, anjos do amor. Algumas até colecionam anjos e anjinhos, têm quilos de anjos pelas prateleiras enviam orações e correntes para todos os amigos das redes sociais.
E assim passam-se quinze dias neste estado de graça angelical, flutuando de um lado para o outro esvoaçando as asas diáfanas e de penas brancas invisíveis, tremulando nas costas.

Amanhece finalmente o décimo sexto dia da mulher. É hora do revezamento. O demônio toma o posto e dá plantão a à partir daí  vinte e quatro horas por dia.
Ai meus deuses!!! – saiam da frente que ai vem a demônia em pessoa!-
Tudo o que foi planejado na véspera já foi esquecido ou não quer mais, ou não tem a menor graça ou importância. É possível que queira tudo diferente agora. Responde mal humorada a tudo que lhe é perguntado.  E ai de quem perguntar o que está havendo com ela. No mínimo fará aquele olhar de piedade envenenada ou total desprezo. Como se fosse a coisa mais natural mudar de uma hora para a outra dessa maneira com apenas uma noite de sono. O estresse é total.
Devora quilos de chocolate e faz mil panelas de brigadeiro (que é o que está na moda).
E a teimosia então?
Antes negociava  a sua vontade com doçura, era toda candura. Agora é sim, sim, não, não e pronto! Fala pelo menos um tom mais alto, mesmo em público e o pior que tudo, qualquer coisa boba leva às lágrimas e ao descontrole. Também algumas riem de tudo em horas indevidas deixando quem está ao seu lado (homem é claro) constrangido sem saber o que fazer, agora se for outra amiga as duas riem juntas e também choram juntas. Um horror!
De manhã começa o suplício antes de ir para o trabalho. Abre o guarda roupas e não gosta de nenhuma roupa, odeia tudo o que está dentro de gavetas e se considera uma desgraçada por não ter nada para usar e uma descalçada por não ter um sapato que combine com os horríveis modelos que não sabe como comprou “aquilo” algum dia. Bolsas? Todas horrendas, não combinam com nada, aliais nada combina com nada.
Se acha enorme de gorda ou magra demais, e o maldito cabelo? É bom nem falar nele. A pele...ha a pele  resolveu virar papel crepom (ela acha, é claro) – Repara só no galinheiro que nasceu ao redor dos olhos de repente? Inacreditável!- E não adianta ninguém dizer o contrário, pois ela acha! Ela vê tudo isso de verdade e sofre. Ela se sente literalmente no inferno.
Ela está na T.P.M. que deveria ser traduzida como Tenham Paciência de Mim, pobre mulher.

Enquanto isso os homens, seres felizes nesse item, nunca irão entender. Ficam perdidos e porque não dizer fascinados com a incoerência quinzenal desse mundo cor-de-rosa.
Esses quinze dias que antecedem o período menstrual são do demônio. Vá de retro!!!


sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Praga de sogra.

                                                              Praga de sogra
Moreirinha Neto entrou no Bar Bicha e pediu uma pinga arretada que hoje a conversa com a Merivalda prometia.
Ela queria trazer a mãe para passar “uns tempos, quiçá morar” e Moreirinha Neto abominava a ideia e, por conseguinte a sogra encrenqueira, e não queria nem por nada que isso acontecesse. E já estavam brigando há duas semanas e a data prevista estava chegando.
Quando entrou em casa, já era noite e ele estava “carcado das ideias”. A segunda novela já ia pela metade e Merivalda escarrapachada sobre o sofá devorava um prato de miojo carregado no queijo parmesão de pacote.
Ao olhar aquilo, Moreirinha Neto se preparou para o que lhe esperava, respirou fundo e perguntou:
-Tem janta para mim?
-Tem agua sal e miojo. O queijo que tinha eu botei todo no meu macarrão.
Moreirinha Neto seguiu na direção da cozinha pensando em fritar um ovo para comer com pão, quem sabe?
Meia hora depois o casal completamente em silêncio mantinha os olhos grudados na novela seguinte que já havia começado e transcorria embalada nas emoções do capitulo.
Envolvidos na fúria da trama em que a mocinha era enterrada viva no cemitério, roíam as unhas e pigarreavam a todo o instante até que entrou o comercial para uma trégua no ódio da história. Foi quando Moreirinha Neto perguntou:
-E a sua mãe como é que fica?
-Hã, do que você está falando?
-Da sua mãe, já falei, ela pretende mesmo ficar muito tempo aqui?
-Claro que vai! E provavelmente para sempre, a pensão que ela recebe só está dando  para pagar o aluguel...
-E eu com isso?
-Melhor parar, nem vou discutir, já está tudo resolvido e pronto!
Uma semana depois a sogra de Moreirinha Neto aportou a bordo de um taxi, toda saltitante e risonha para desespero dele.
Passados alguns dias de educação forçada e explícita as vozes começaram a se alterar de vez em quando ainda dominadas a freios fortes.
Até a noite da grande discussão, quando já a beira de um ataque de nervos, Moreirinha Neto informou às damas que ele passaria o final de semana pescando.
Quando falava educadamente ouviu um grunhido daqueles clássicos; - Humm, ai tem.-
E não deu outra; ele pegou uma abóbora da fruteira e jogou na direção da sogra que se não desse uma guinada de cabeça estaria desmaiada e coberta de pedaços do fruto alaranjado.
-Seu desalmado! Você não vale a comida que come, vou lhe rogar uma praga para nunca mais me desrespeitar, você vai ver, não me desrespeite!!!
E caiu no sofá, aparentemente desacordada enquanto a filha a abanava freneticamente em desespero.
Quando ele saiu batendo a porta a sogra abriu os olhos e mais que depressa sentou no sofá e disse para a filha: não se preocupe, eu já lancei a praga que eu lancei para o seu pai nunca mais inventar essas pescarias que não passam de reunião da gandaia masculina com mulher, bebida e tudo. Fica sossegada, você vai ver.
Merivalda caiu em prantos, já arrependida de ter trazido a mãe para morar com eles. Ela faria melhor pagando o aluguel para a mãe continuar morando na casa dela.
Enquanto isso Moreirinha Neto, solitário, montava a barraca onde pretendia ficar todo o final de semana. Era pena não estar de férias ou já aposentado para não voltar tão cedo para casa. Já anoitecia e Moreirinha Neto, nervoso ainda por demais, não parava de pensar na mulher e na sogra. Para espairecer foi até o carro e ligou o som bem alto enquanto terminava de montar a barraca na beira do rio.
Bem mais tranquilo um tempo depois, ele tomava café sentado numa pedra, olhando as estrelas e pensando na vida até que o sono tomou conta e ele resolveu ir dormir.
Entrou na barraca e nem dois minutos depois pegou no sono ao som da noite e das águas do rio.
Dormiu aproximadamente quinze minutos quando de repente um berro apavorante ressoou na noite enquanto ele dava um pulo dentro da barraca e se desvencilhava aos gritos da barraca e cobertas. Correu em direção ao rio e mergulhou de roupa e tudo na água gelada, entre os panos e cobertas.
Coitado do Moreirinha Neto, tão nervoso estava quando chegou que montou a barraca sobre um formigueiro de beira de rio. Um horror!
Mas horror mesmo era voltar para casa e aguentar o veneno da sogra, ninguém merece!
Vá rogar praga assim... Lá na beira do rio!