quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

Com que roupa?


                                                       Com que roupa?
Há dias que Otávio passa horas cabisbaixo, pensativo, distraído mesmo.
Dai que hoje lhe perguntei o motivo, cheguei a pensar em paixão, mas não, depois de relutar em não me dar qualquer satisfação, como é do seu costume, ele me disse que os dias estão passando correndo e ele ainda não se definiu qual fantasia usar neste Carnaval. Foi convidado com deferência pelas agremiações para comparecer aos desfiles como destaque e não sabia o que vestir.
Realmente ele estava numa sinuca de bico, seja lá o que isso queira dizer, acho interessante a frase e a comparação. Dai naquele meu jeito delicado de ser sugeri: "por que não vai de Pierrô ou Arlequim"? E ele fuzilando me respondeu sem paciência: "muito criativa você!" e eu continuei então: "Colombina"? Bem não vou repetir o palavrão para não tirar a nobreza da pessoa.
- Mas o que tem de mal, essas fantasias clássicas da folia, não entendo?!
- Acontece que eu preciso de uma fantasia impactante, que seja algo que cause entende?
- Que cause... sei...
E me botei a pensar com meus três neurônios e posso garantir que nenhum deles é folião. Chegou a me dar sono de tanto imaginar roupas diferentes cheias de cores, penas e brilhos e possibilidades mais rústicas.
- Quem sabe uma fantasia de rato?
- Rato, enlouqueceu é?! Imagine um gato totalmente "engolido" por um rato, que coisa mais patética!
- É que pensei no impacto que iria causar...
- Sim, derrocada explícita e assumida da minha raça, se desde que o mundo é mundo os Gatos são superiores em estratégias aos ratos, dai eu sou literalmente engolido por um e vou sair pulando de alegria, que insanidade, bem se diz que quem não gosta de samba bom sujeito não é, é ruim da cabeça (o teu caso) ou doente do pé (também).
- Pois é, mas não gosto de te ver assim triste e queria ajudar...
- "Mais ajuda quem não atrapalha"... ditado perfeito para a sua pessoa.
Fui para o meu quarto chateada e acabei ficando contagiada pelo o baixo astral dele, querendo ter uma grande idéia para alegrá-lo, afinal é carnaval!
Mil figuras fantasiadas me passaram na mente como um desfile de carnavais passados.  Resolvi ver no Google alguma coisa, mesmo que discreta e fácil de confeccionar à toque de caixa como era o caso, mas todas eram muito trabalhadas e estranhas a partir dos títulos à elas atribuídos:  "Ave do Paraíso Apaixonada  e seu coração de cristal azul", "Galo da montanha do Himalaia transmigrado para o Sertão Brasileiro", " O Faraó que roubou o brilho das estrelas mortas"... e por ai continuava o séquito de estranhas figuras com seus títulos bizarros parecendo de teses a serem defendidas diante de Bancas, mesmo reconhecendo que no seu trabalhado eram belíssimas.
Resolvi fazer um café para raciocinar um pouco. Enquanto o café escorria na cafeteira pensei que ele poderia ir vestido de Grão de café e fui correndo dar-lhe a boa notícia. Era uma fantasia razoavelmente fácil de fazer, se tivéssemos material para a execução, claro, tipo espuma em metro na cor marrom escuro, que mais se aproximasse daquela semente, mas não temos nada desse tipo em casa, talvez um carretel preto e um branco de linha e duas agulhas para uma emergência, um botão caído, um rasgo e é só...
Toda animada fui falar para ele o que eu pensava ser uma brilhante idéia. Nem me deixou acabar de explicar com detalhes e já me fuzilou, mais uma vez com seus olhos amarelos, daí tive a grande idéia, ou pelo menos me pareceu ser  naquela hora.
- Vista-se de febre amarela! Está na moda, só se fala nela e  seus olhos que já são amarelos vão sobressair, seu pelo é grande e escuro daí para imitar um macaco é um pulo hahahah...
Não resisti a gargalhada final e quase levei na cara com a almofada que veio voando na minha direção.
Voltei correndo para a cozinha enquanto ele batia com a porta dos seus aposentos duas vezes deixando um bilhete do lado de fora avisando que não estaria para ninguém, nem se o Rei Momo e suas princesas viessem em pessoa buscá-lo para as folias momescas,  e que só o acordasse na quarta feira de cinzas depois do meio dia, e mais não disse.

Vai um cafezinho aí?