sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

Então é Natal ♫♪♥♫♪


                                                  Então é Natal...♫♪♫♪
O Sol amanheceu radiante. 
O menino afastou do rosto magro e sujo o pedaço de pano que fazia de coberta. 
Esfregou os olhos escuros chocados pela luz intensa. Sentou-se e olhou ao redor observando o que acontecia e achou tudo muito estranho. Tudo ao seu redor parecia parado, sem o movimento habitual, não via ninguém conhecido, alguns passavam ao longe sem vê-lo, mas isso já não lhe causava estranheza, pois sempre fora assim...
Deitou-se novamente e observou que o banco da praça estava mais macio e menos frio... Fechou os olhos novamente e relembrou o que havia acontecido horas antes quando havia se sentado à porta da Igreja Matriz para pedir uns trocados àquelas pessoas bonitas e bem vestidas que vieram à missa da meia noite.
O sino havia tocado, ele achava muito bonito o som intenso dos sinos e saiu de onde estava. Logo se aproximou da grande porta, mas achou melhor não entrar. Geralmente as pessoas não permitiam que entrasse nos lugares bonitos, imagine a igreja em hora de visitas?
Sempre olhava o interior da Igreja de longe, só da porta, e achava tudo lindo e muito brilhante e hoje voltou para ver de perto novamente. De noite ele não seria visto e poderia se esconder melhor.
De vez em quando olhava para dentro e a musica lhe causava um conforto dentro do peito franzino tão especial que nem sabia por que, tinha vontade de chorar.
Quando todos entraram, ele sorrateiramente esgueirou-se para não ser visto e sentou nos degraus de uma escada que levava ao mezanino onde um órgão esplendoroso era dedilhado habilmente por um jovem padre. A música parecia preencher seu peito de menino, poderia ficar por horas,
 talvez dias só ouvindo aquela música maravilhosa.
Acomodou-se como pode para assistir e ouvir o som de Deus. Seu coração cada vez batia mais forte e lágrimas rolavam pelo seu rosto. Emoção era um sentimento novo para ele, mas lhe fazia muito bem. Em dado momento em que o Padre que executava o ritual de orações e música silenciou as palavras santas e elevou algo para o alto, o menino pode ver uma luz intensa que refletia das mãos daquele homem que se vestia de branco e orava com fervor. A visão lhe causou espanto e admiração e fez o coraçãozinho bater mais forte e a emoção aumentou. Quase soluçava.
Foi quando percebeu alguém sentado ao seu lado na escada que levava a parte superior de onde saía a música. Ia se levantar ligeiro para sair correndo antes que fosse enxotado como de costume, quando sentiu um braço deslizar pelos ombros e uma sensação agradável de aconchego o inundou inteiro, como nunca sentiu em sua pequena vida. 
Não conseguia parar de chorar, pela primeira vez não teve medo ao ser tocado por alguém.
Falando baixinho entre os cânticos da missa, aquele homem lhe perguntou o que ele queria ganhar de Natal e o menino abaixou a cabeça e ficou mudo a pensar; - o que ele poderia querer se nem sabia o que era viver como os outros meninos que ele observava de longe com suas famílias? -. Sempre vivera sozinho desde que nascera nas ruas daquela cidade e nem saberia dizer há quantos anos isso acontecera. Via a vida passar por ele, mas ele não tinha vida, ele apenas sobrevivia.
Timidamente ele arriscou numa voz quase inaudível:
- “Quero viver sem passar fome e nem frio, sem ter medo, sem apanhar e sem precisar o tempo todo correr e me esconder das pessoas malvadas.”.
Não sabe como saiu dali, da Igreja e agora, ele estava ali naquela praça, acordando naquele banco macio e notou que estava sem fome, sem medo, sem frio, limpo e arrumado como as pessoas da missa, quando viu alguém se aproximar. 
Era o homem que conversou com ele nos degraus da Igreja enquanto os outros cantavam e rezavam.
- E então, meu bom garoto, gostou da nova morada? Aqui você pode viver sossegado, fazer amigos e ser feliz como me pediu ontem à noite.
- Onde estou, quem é o Senhor?
- Me chame de Jesus, você está no céu das crianças...


                                                                                   XX


“... E é morrendo que nascemos para a vida eterna...” (oração de São Francisco de Assis)

sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

O Visitante


                                                        O visitante 
Eu estava entediada e resolvi chegar até a janela do meu quarto que é de onde vejo melhor a paisagem que se compõe de um pátio de carros para vender, um pedaço de uma favela de grande movimento que perderam espaço no meu visual para alguns prédios novos ainda não habitados.  Mais à direita me distraio a contar quantos carrinhos vermelhos passam pela rodovia de transito intenso, às vezes escolho outra cor, para variar....
E cá estou eu ouvindo os gritos estridentes de um Benteví que chama seu companheiro para aventuras celestes, quando um assovio estridente me faz arrepiar os cabelos e desce pelas minhas desprevenidas costas geladas.
Uma sombra seguida de uma intensa luz de um holofote se interpôs entre o sol e meus olhos não me deixando ver mais nada à minha frente. Fechei-os por um momento, cega e curiosa para ver o que estava acontecendo ali diante de mim, foi quando um som metálico, semelhante às vozes de robô me fez abrir, e na verdade arregalar, meus olhos desmesuradamente simplesmente porque ali estava diante de mim um artefato metálico voador achatado e coberto de uma nuvem que mais parecia uma couve-flor gigante zumbindo e trepidando suavemente.
Tornei a fechar os olhos, os esfreguei pensando que estava delirando e rapidamente escaneei meu cérebro para ver se havia tomado algum remédio que provocasse efeitos colaterais, tipo alucinações, mas não; além dos de sempre, de um tempo para cá eu costumo tomar uma pastilha efervescente de vitamina C pela manhã.
A coisa voadora então soltou o que chamo de voz, para não causar mais confusão mental e grunhiu:
-Tudo bem com a senhora? Vamos dar uma volta, um passeio?
Olhei para os lados para ter certeza que a pergunta era feita para mim, ou para outra maluca do prédio, mas era para mim mesma, pois se fosse em outro andar ele subiria um pouco mais para ficar de vis à vis com a pessoa.
Então respondi como as velhas respondem;
- Não meu filho, está quase na minha hora de fazer uma coisa aqui em casa, vai você meu filho, pode ir que fico bem aqui...
- Vem com a gente, a senhora vai gostar, vamos dar um passeio...
- Mas a onde que vocês estão indo?
- Por ai, conhecer uns lugares, vem com a gente...
Eu olhava aquele rosto na minha frente fixamente e a voz dele aumentava e sumia aumentava e sumia, até que acordei no chão, rodeada dos socorristas da ambulância, que veio me buscar, chamada pelos vizinhos que me viram caída no saguão do prédio.
Ainda não me lembro se eu estava saindo ou chegando da nave...

( Acho bom avisar aos desavisados que esta é uma obra de ficção...)