quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

Meu Cavalo por um Reino

                                   Meu Cavalo por um Reino
Estava eu, no meio da tarde, lendo meu livro, totalmente distraída, quando ouvi o barulho da porta da entrada batendo e estremecendo tudo.
Como estava sozinha há horas, logo vi que era a criatura peluda de olhos amarelos chegando “silenciosamente” SQN.
Sentindo “algo no ar” nem me dei ao trabalho de levantar de onde estava, pois sabia que ouvir sentada seria bem mais seguro.
Apenas lhe perguntei o que houve e ele, sem disfarçar a euforia, me contou que havia ganhado um cavalo numa rifa.
Ainda bem que eu estava sentada, pois senão haveria a necessidade de fazê-lo.
- Como assim, um cavalo!?? Aquele quadrúpede que puxa carroças desfila em casamentos Reais e também em paradas militares?
(Acabei de me dar conta que até os animais também precisam de “sorte” para nascer).
- Sim, claro!
- Melhor seria um cavalo marinho, daqueles que nem precisam da fêmea para se reproduzir, são criaturas autossuficientes. Incrível logística de dois em um, ou seriam três em um... Deixa para lá, me conte mais do seu cavalo e para quem você deu ele de presente, alguém lá mesmo no sorteio?
- Como assim, dei o cavalo de presente? É claro que o trouxe para casa e está pastando no jardim...
- Mas não podemos nem ter cavalos e nem coloca-lo no jardim do condomínio, sem falar em quem vai recolher o que ele “deixar” pelo caminho? Nem pense em mim!
- Parece que a vida se resume em recolher excrementos de animais; todas as vezes que pretendi ter algum, logo você vem com essa pergunta... Você não consegue ver a beleza do animal, a postura, o garbo?
- Não! Eu sei que se eu permitisse algum animal aqui em casa, essa parte sobraria para mim, com certeza, então nem cogitar, e por agora só consigo pensar em como vamos nos desfazer desse elefante branco...
- Não é elefante, é cavalo, não mistura as coisas, parece que delira.
- É maneira de falar seu bobinho, elefante branco é uma expressão que se usa quando não se consegue desfazer de uma coisa, porque na Índia os elefantes são sagrados e os brancos não podem ser vendidos e quem tem não pode se desfazer deles, é mais ou menos isso.
- E o que o nosso cavalo tem a ver com isso?
- Primeiro que não é nosso; é apenas seu. Depois que estou explicando que não podemos ficar com o cavalo, nem que fosse em ouro maciço. Aliás, seria muito bom se fosse em ouro mesmo...
- Não vou me desfazer porque tenho planos para nós que vai virar ouro, está bom para você?
- Como assim?
- Vou treiná-lo para corrida. Vou até a Hípica e inscrevê-lo para a próxima corrida, ouvi dizer que dá uma grana federal.
- Vai pensando que é fácil fazer parte de um dos clubes mais elitistas que existem, ali só entra indicado por algum sócio e precisa ter muiiiitos zeros na conta, não temos cacife para entrar num lugar desses, nem como convidado, é outro Universo. Até o cavalo é de outra estirpe, eles, os cavalos, olham os pobres mortais que o observam na maior superioridade, só os sócios ricos podem lhes oferecer torrões de açúcar, e afagar seu pescoço. Sem falar que se o seu cavalo foi ganho numa rifa deve ser um pangaré de cem anos que mal se sustenta nas quatro patas...
- Também não precisa esculachar com o pobre do cavalo, realmente ele precisaria até um banho de alguma tintura de cabelo para dar uma cor e brilho na crina, mas isso a gente resolve com capricho, aliais, acho que para passá lo à frente vou ter de fazer isso mesmo, passar uma tintura de cabelo, até porque para ganhar a rifa tive que comprar quase todos os bilhetes lá na Padaria hoje cedo, parece que ninguém queria comprar... Mas você é desmancha prazer, em?
- Eu?!?

Quem quer comprar um cavalo aí?

domingo, 23 de dezembro de 2018

Natividade

                                          Natividade
Neste período, quando os Cristãos celebram a Natividade, podemos apreciar pelo menos por alguns dias, que muitos corações arrefecem do ódio e da amargura e que o egoísmo fica esquecido numa gaveta até que passem as festas de final de ano.
Podemos apreciar que muitos se dispõem a distribuir um pouco do que lhes sobra e que provavelmente nem lhe fará falta, mas isso não importa de verdade, porque ser bom e caridoso se aprende exercitando e que amar se aprende amando.
Importa mesmo é que por alguns dias a fome irá diminuir e que os desvalidos serão olhados como irmãos e receberão sorrisos nunca antes percebidos nos rostos apressados.
Que bom que pelo menos nos finais de Ano, o Menino Jesus renasce e os corações se transformam em manjedouras para recebê-Lo. 
É bonito ver que as pessoas O recebem de braços abertos, carregando no colo Aquele que se fez menino para enternecer os corações endurecidos e a psicosfera do planeta fica até mais leve.
Mas ainda precisamos muito rever e celebrar os seus ensinamentos; reciclar nossos sentimentos, promover a paz e perdoar aquele que de alguma forma nos prejudicou, pois ele ainda não sabe o que faz.
Assim como a Esperança nasce com a alvorada de um novo dia, vamos nos renovar em sentimentos e comportamento, promovendo um mundo melhor e ser melhores a cada dia porque amar se aprende amando e não se pode amar odiando alguém.
O Perdão liberta a quem perdoa.

Desejo a todos um Feliz Natal extensivo aos familiares.


terça-feira, 11 de dezembro de 2018

Tatoo

                                                Tatoo
Amanheceu um lindo dia, mas por razões desconhecidas não estou com vontade de sair de casa. De vez em quando vou até a sacada e fico ali até que o sol me mande para dentro. Hoje estou mais para relógio cuco, entro e saio da sacada de hora em hora.
Daí que estou lendo calmamente, estirada no sofá, enquanto o meu companheiro se enrosca nas almofadas no outro lado, ronronando candidamente.
Até ali, muita paz ao meu redor, até que a criatura começa a se espreguiçar e me fixa com seus olhos amarelos como o sol que brilha lá fora. Por um momento aprecio a sua beleza felina, mas foi só por um momento, pois em seguida ele me informou que iria sair. “Como assim, sair?” lhe perguntei.
- Vou sair para fazer uma tatuagem, sonhei que fazia uma tatuagem e é o que vou fazer, já resolvi...
Fiquei sem fala olhando espantada aguardando ele dizer “brincadeirinha!”, mas não disse; foi até o quarto e pegando a mochila se encaminhou em direção à porta de saída.
- Ei! Está falando sério?
- Claro que estou, ora. Eu sempre falo serio, parece que nem me conhece depois de tantos anos...
- Aí se encontra o perigo, te conheço muito bem! Me explique por favor,  muito bem explicadinho antes de sair, que história é essa de fazer tatuagem, depois eu resolvo se deixo ou não; me convença com seus argumentos.
- Não têm aqueles caras que raspam a cabeça e depois cobrem de tatuagem?  Pois é o que farei, vou raspar o meu pelo e me desenhar...
- E o que pretende desenhar neste corpinho magnífico?
- Sei lá, acho que os tatuadores devem ter books de seus trabalhos, pois não?!
-Imagino que sim, mas você já deve ter uma ideia formada, pelo menos, não? Afinal é um leque de opções infinito, vai tatuar flores, fadas, dragões, elfos ou o quê?
- Elfos?! De onde você tirou essa ideia?! Nunca vi ninguém com elfos tatuados...
- Pois eu vi ontem mesmo uma menina com um elfo enorme nas costas...
- Você disse bem; “uma menina”. Elfos, fadas e afins, são figuras para meninas...
- Desde quando você virou machista?
- Desde que resolvi fazer uma tatoo... Poxa; não consigo me definir por algo marcante, que faça a diferença na minha vida, neste momento único que é o de fazer uma tatuagem, afinal essa marca vai ficar para sempre, talvez eu até venda a minha pele para os Chineses fazerem um abajur ou uma bolsa, quem sabe, eles pagam milhões... $$$$
- Sabe o que eu acho? Que está na hora de voltar para as almofadas e dormir mais um pouco; se algum Chinês vier fechar um contrato de compra de pele contigo, eu te chamo, pode deixar...

Tatuagem... Era só o que faltava... Quem vai cochilar sou eu, depois dessa...


quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

Uma vez Flamengo, Sempre!


                           Uma vez Flamengo, sempre! 
Hoje saí de casa por volta das dez horas. 
Tomei o ônibus de sempre e dois pontos adiante entrou uma senhora um pouco acima do peso, toda esbaforida e sentou-se no banco individual logo à minha frente, que estava num banco duplo, sozinha, e em altas vozes, totalmente à vontade, foi conversando com o motorista e o cobrador postado logo atrás de mim.
Do meu ponto de observação pude notar que ela se vestia com a camiseta do time da cidade, aquele que passou para a primeira divisão, e para completar o traje, a calça, o tênis, brincos, as unhas e alguns anéis exibiam a cor azul celeste também; provavelmente para não deixar duvida nenhuma da sua preferência esportiva.
Daí que ela entrou no ônibus resfolegando e foi logo reclamando da fila interminável de todos os dias, do transito parado para entrar na ponte em direção à ilha e da demora em chegar no serviço
Depois falou que trabalhava desde os 12 anos como doméstica, que não pode estudar porque a mãe não deixou, porque se ela aprendesse a escrever ia fazer carta para os namorados em vez de fazer o serviço, e agora com 72 anos ainda precisava trabalhar. 
E continuou falando, pois a fila demora mesmo e assim conversando o tempo passa mais rápido.
Falou que os filhos não a visitam em casa, então eles se encontram num jardim público, no bairro ao lado. Ela falou que quase não vê os netos, que um deles já tem 20 anos e não o vê desde pequeno, nem o conhece, porque a outra avó é rica e não deixa, porque que diz que onde ela mora é muito perigoso, ela diz que é zona vermelha, mas ela mora há cinquenta anos naquele lugar, a casa é dela e nunca aconteceu nada, o que ela vai fazer? Mas a “rica” tem medo do filho, no caso genro dela, ir lá com as crianças e acontecer alguma coisa.
O outro filho mora no interior, esse ela não vê mesmo e nem conhece os netos. 
Daí que ela não estudou nada, mal sabe “algumas letras”, mas a filha da patroa, que já foi professora e agora tem um bom emprego e ganha muito bem, um dia resolveu ensiná-la a ler, porque por várias vezes pegou o ônibus errado e foi parar do outro lado da cidade. Então ela conseguiu aprender alguma coisa que dá para o gasto.
Foi a maior felicidade quando ela conseguiu ler as placas dos ônibus, então o que ela fez? Foi até a rodoviária e comprou uma passagem de ônibus para o Rio de Janeiro para ver o Flamengo jogar! Sim, viajou a noite toda e logo que chegou na rodoviária do Rio pegou o ônibus para o Maracanã e foi assistir o jogo do Flamengo. realizou um sonho.
Na volta comprou a passagem para São Paulo, depois para Curitiba e de Curitiba veio para Florianópolis. Foi e voltou sozinha!

Quando chegamos no terminal central, cada um foi para o seu destino, e a torcedora toda trabalhada no azul, ia toda faceira porque agora sabia pegar o ônibus certinho, afinal já tinha ido até o Rio de Janeiro!...
Que bom, fiquei feliz por ela que tem a minha idade e me pareceu uma pessoa bem resolvida apesar de sofrida.

P. S. A maioria do pessoal de Floripa tem como segundo time o Flamengo, são fanáticos; quem é daqui sabe... ela é Avaí e Flamengo... O que eu achei interessante foi que a primeira decisão que ela tomou ao aprender a ler foi pegar um ônibus e ir para o Rio assistir o Flamengo jogar no Maracanã. O que será que eu faria no lugar dela? Qual seria a minha prioridade, o meu sonho de consumo?