Enquanto as Violetas caem...
Zelda, no momento com 16 anos, só pensava em ser escritora. Acordou com aquela obstinação que os jovens possuem, quando querem alguma coisa. E hoje essa coisa, era ser escritora. Amanhecia quase sempre com uma personalidade diferente, também uma característica da idade. Cada momento uma vida.
Naquele dia ela apareceu para tomar o café da manhã, toda vestida para sair. Calça jeans, camisa, tênis, óculos (que detestava até ontem) e uma pasta na mão. Tudo bem discreto Tomou o suco, olhando para fora da janela, completamente “fora do ar”.
Esse comportamento mutante e criativo, preocupava muito seus pais. Mas a psicóloga os tranqüilizava dizendo que a adolescência era uma fase, e que um dia ia passar. Só que desde os doze anos ela entrava e saia de uma fase para a outra, sempre com muita determinação. Para ter idéia, quando estivera apaixonada por futebol, acordava e dormia vestida com as cores do time e usava por baixo do uniforme escolar, um uniforme de jogador, Outra época dizia ser uma bailarina famosa, vivia na ponta dos pés o tempo todo , até que deu uma torção no tornozelo, que a deixou com o pé imobilizado tempo suficiente para desistir do intento. Outra vez, “descendia” de uma tribo de ciganos e vestida a caráter, vivia lendo as mãos e lendo cartas adivinhatórias, dos vizinhos do prédio onde moravam. Ninguém estranhava mais essas “novidades” de Zelda.
Hoje ela acordou querendo ser escritora. Saiu à rua, querendo ser escritora. Foi à escola, querendo ser escritora. Era só nisso que pensava. Tinha mil idéias na cabeça. E naquela
hora, durante a aula, não tirou os olhos do professor a sua frente.
“...todos os que escrevem, colocam no papel seus sentimentos bons e maus. Suas idéias mais profundas ou superficiais. Mas o mais importante é que o que se passa naquele momento dentro de si é a mais pura verdade...”
E com essa frase, o professor de Literatura terminou a aula, deixando Zelda flutuando encantada e mais do que nunca, desejosa de ser escritora famosa.
Suspirou profundamente, lembrando-se do seu muito amado professor. Sim, era por isso que Zelda queria ser escritora, para que seu amado falasse dos livros escritos por ela com a mesma paixão que ele falava dos escritores durante as aulas. Tinha tanta paixão por ele que até doía. Bebia suas palavras e até chorava com a sinceridade dos seus dezesseis anos, quando as colegas riam do seu amor não correspondido.
Naquele dia foi para casa em silêncio pensando na aula, no que ele dissera; “Todos os que escrevem colocam no papel seus sentimentos...”
Chegou em casa, não falou com ninguém e não quis comer; foi para o quarto e começou a escrever e escrever sem parar, até que dormiu exausta.
Pela manhã o sol a encontrou ainda vestida e estendida, atravessada na cama, rodeada de bolas de papel amassado. O semblante calmo e despreocupado, mostrava que tinha se apagado mais uma chama forte e luminosa como o sol pela manhã, mais uma paixão e que iria fazer parte das experiências e lembranças daqueles que conseguem viver a cada momento, uma curta mas sempre intensa, paixão de adolescente.
Numa folha de papel ao lado dela estava escrito:
Enquanto as violetas caem...
Enquanto as violetas caem sobre a relva fresca,
após o vento arranca-las da cesta que carregava nos braços,
saí pisando com os pés molhados
da água do regato que passava ao meu lado.
O sol se põe lá longe...
Como eu gostaria de ir com ele, para onde ele vai...
O vento passeia por mim ligeiramente
com a pressa de quem vai em busca da felicidade...
Os pássaros em algazarra, dão o recital do fim de tarde.
E lá vou eu, passo a passo,
a caminho do horizonte...
O lugar que me cabe como moradia, como um estado de ser e de estar.
Lá vou eu...as violetas rolam por algum tempo
ao meu lado, carregadas pelo vento
que me devolvem o seu perfume.
E eu, sigo o meu caminho
andando para o futuro...
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