Alto Escalão
Acordei bem cedo e fiquei por uns momentos ouvindo
enternecida os passarinhos cantarem nas árvores do Condomínio onde moramos.
Fiquei embaixo do edredom cheia de preguiça dando um
tempo para me encorajar e começar meu dia. Um pouco mais atenta aos rumores do
amanhecer percebi o cantarolar baixinho do Otávio e de água de chuveiro
escorrendo. Ele estava feliz, ao mesmo tempo que isso era bom, também podia não
ser...
Imediatamente liguei minhas antenas e radares, ajustei
a sintonia para o modo "paciência" e me levantei. Cruzamos no
corredor, em silêncio trocamos olhares e ele me fez o gesto clássico dos anos
sessenta; Paz e Amor com os dois dedos, indicador e médio, entreabertos e para
cima.
Enquanto a água escorria pelo meu corpo reforcei as
minhas orações e liguei o botão de alerta no modo "piscando" em pulso
lento para crescente. Sentia alguma coisa no ar, o famoso sexto sentido, que
temos e nem sempre damos atenção.
Mais tarde, enquanto tomava meu café e lia meu jornal a
campainha estridente do telefone me assustou e um banho de adrenalina se
espalhou pelo meu corpo me fazendo derramar o líquido precioso que me mantém
ligada, o meu café. Neste momento o alarme do meu sismógrafo particular me
avisou da possibilidade de um terremoto à caminho. Ajustei as orelhas para o
modo atenção máxima e fiquei ouvindo a parte de cá da conversa enquanto pensava
em quem poderia estar ligando para ele à esta hora, para a criatura peluda que
mora comigo, sobrinho do último Xá da Pérsia, mais conhecido como Otávio; Quem
poderia ser?
Infelizmente como só ouvia o lado de cá fiquei
curiosíssima, pois ele só respondia: "não, claro que não, impossível, sem
condições, tenho outros compromissos agendados, concordo que seja para poucos,
mas vou declinar, avise que fica para uma próxima... obrigada... veja bem...
avise que não adianta insistir... e nem enviar o convite pessoalmente por
mensageiro tão digno que não estou interessado. Obrigado, passar bem..."
Em seguida desligou e me olhou com aqueles olhos
amarelos impassíveis e em silêncio por alguns segundos. E sem nada a comentar
se dirigiu para o quarto e sem cerimônia se refestelou entre as almofadas
preferidas.
É claro que fui saber do que tratava tão misterioso
telefonema, e sabe o que me disse com aquele olhar entediado que lhe é
peculiar?
Dito isto, se acomodou e dormiu imediatamente, e eu
voltei para o meu café e ao jornal molhado...
É mole conviver com essa criatura peluda?
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