segunda-feira, 4 de abril de 2016

Pena eu?

                                                                Pena eu?
 Sabe aquelas colecionadoras compulsivas, daquelas que escolhe um objeto para amar e colecionar e vai longe, literalmente, para conseguir novos exemplares?
Pois é, dona Angolina não era diferente. E por morar numa cidade pequena se tornou uma pessoa folclórica.
Sim, ela colecionava galinhas de todo tipo. Tinha tantas imagens das penosas que a sala ficou pequena para tantas que muitas se espalhavam por toda a casa. 
Sua cama era em forma de ninho com colchão, cobertas e travesseiros de penas de galinha que eram levados ao sol diariamente, para não criar “piolhinho de galinha”.
Tomou para si os hábitos galináceos de acordar com o cantar dos galos que criava no quintal e ia dormir com as galinhas logo ao escurecer. “Galinha velha, poleiro cedo” repetia sempre ao sair da padaria nos finais de tarde carregando um pão de milho.
Era apaixonada pelas galinhas desde criancinha, ela, não as galinhas, e abominava o ato de matá-las para comer. Jamais havia comido uma só coxinha de asa bem fritinha no alho e óleo ou chupado aquele pescocinho delicioso que vem mergulhado na canja. Não sabe o que perdeu.
Aliais ela jamais tomou canja na vida!  - Falava com orgulho. -
 Para ela, era comer suas “irmãs” ou seus ovos, era um ato canibal seja lá o que isso represente.
Era solteirona e maldosamente diziam que era porque ainda não havia encontrado o galo encantado.
Suas roupas eram de estampas semelhantes aos desenhos das galinhas carijós e d’Angola, todas pintadinhas e as famosas “pied de poule” eram as suas preferidas.  
Usava sempre chapéus com penas decorativas e esvoaçantes para se proteger do sol sempre que saía à rua, e se sentir “empenada” (essa foi infame) como suas “irmãs” de penas...
Sua fascinação pelas penosas chegou a um ponto de fanatismo pela espécie que chegou a ir ao médico reclamar de dor na moela, no que lhe foi receitado reduzir alguns grãos pelo excesso de glúten.
Certo dia ao acordar se olhou distraidamente no espelho e voltou a olhar melhor quando reparou que a quantidade de “pés de galinha” havia aumentado em seu rosto e isso por mais incrível que possa parecer, deixou-a super feliz. Tão feliz que resolveu voltar ao ninho, como chamava a sua cama, e dar mais um cochilo.
Daí sonhou que havia de fato se transformado numa imponente galinha d’Angola e que toda vaidosa caminhava pela cidade carregando uma linda cesta decorada com um laço de fita azul e com uma dúzia de ovos dentro. Era seu tesouro. Iria chocá-los e criar seus pintinhos.
Continuou seu passeio e se dirigiu até a praça onde havia uma grande festa e no alto do coreto um galo cantava cada vez mais alto, só que era um galo de catavento que girava ao vento sem parar. Foi uma decepção, mas a música continuava e ela encantada com o canto parou extasiada diante do coreto.
De repente o catavento parou e a música também e o galo de metal desceu se transformando em um galo de verdade, lindo, imponente cheio de penas coloridas, sacudindo nervosamente a crista vermelha diante dela e seus ovos.
Emocionada, com olhos lacrimejantes ela se emocionou quando ele começou a cantar para ela em tom melodioso, “Esse cara sou eu” com a voz de ninguém menos que do autor Roberto Carlos.

Foi quando uma voz cortou a melodia gritando: 

Pamonha, pamonha, pamonha fresquinha....

É claro que Angolina acordou injuriada com o carro da pamonha passando na sua porta e tocando a música do "Rei" no maior volume fazendo acabar o encanto...
- “Arrehégua”, quem come pamonha a esta hora da manhã?-



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