sábado, 5 de dezembro de 2015

Tempos Reciclados e Tecnologias.

                                                   Tempos Reciclados e Tecnologias
Fui até os fundos e peguei a cesta, voltei para a cozinha e escolhi da fruteira sobre a mesa, algumas frutas. No armário peguei bebida láctea de tamanho pequeno, mais um pacote de bolachas e outro de pipoca de Micro-ondas.
Sai dali logo após colocar o GPS entre as frutas dentro da cesta e em seguida cobri tudo com um guardanapo xadrez e a deixei sobre o sofá perto da porta de saída.
 Enquanto vestia minha capa vermelha me olhei no espelho para ajeitar o gorro que encobria parte os meus cabelos.  Só então sai para a rua e caminhei na direção do metrô.
Quase chegando à esquina a voz da máquina começou a me dar direções diversas e contrárias e aquilo foi me irritando e a maldita parecia ler meu cérebro, por que dizia frases sem noção e passou a repetir sem parar;
“Entre à direita.”  “Vire à esquerda”. “Siga em frente!”
Havia pensado antes de me preparar para sair, dos antigos métodos de ir deixando pedrinhas pelo caminho ou pedacinhos de pão para encontrar o caminho da volta, porém me lembrei de que nem sempre funcionou nos contos de fadas e uma parte do caminho terei de ir de Metrô, pois preciso atravessar toda a cidade e chegar à casa da Vovozinha antes do por do sol e da novela das seis, porque pretendo assistir ao seu lado o capitulo de hoje comendo sequilhos de araruta que ela faz maravilhosamente bem e tomando limonada colhida no quintal.
Durante o trajeto fui ouvindo a voz do GPS que parece saída de dentro de uma lata de biscoitos quadrada e funda e que usa palavras que não conheço ou não é do meu vocabulário:
“...estamos chegando na rotunda, contorne a rotunda, entre à esquerda depois da rotunda... ”.
Aquela “fala” me irritava por demais e continuei cada vez mais apressada com aquela irradiação louca ao meu lado, no meu ouvido.
Ao caminhar na direção do Metrô percebi muitas outras pessoas estava portando também um GPS no bolso, nas bolsas e nas sacolas, o mesmo tipo de GPS que falava com a mesma voz esquisita. 
E como uma situação surreal dentro do vagão do metrô, uma “conversa paralela” entre os GPS se estabeleceu e enquanto entre os homens as máquinas trocavam informações políticas e financeiras, outras trocavam receitas e fofocas da televisão criando “vida inteligente”. Acho que os GPS daquele dia captaram as conversas dos celulares.                                                               E assim a viagem transcorreu rapidamente, parecendo um mercado para surpresa de uns e apreensão de outros.
Ao descer na plataforma que me levaria à casa da minha avozinha a voz logo gritou:
“Suba as escadas!”
Como se houvesse outra opção!
 Naquela hora enlouqueci e fiquei tentada a jogar fora a “maquininha” maluca e falante nos trilhos e a deixar para que o vagão passasse por cima fazendo calar a voz de lata. Mas o trem passou e ela misteriosamente não foi atingida e continuou falando sozinha e avisando que saí da rota programada em casa.
Finalmente cheguei à rua, no meio da multidão apressada, fechando quase totalmente os olhos pela claridade que ainda inundava o final de tarde. Atravessei a avenida na faixa de pedestres chegando perto da “rotunda” a voz maluca começou a gritar; “depois da rotunda entre à direita há 200 metros.”
Era outra pessoa que carregava uma máquina igual a minha e que fazia a mesma coisa, estava “possuída” pela interferência das conversas dos celulares.
 Me indignei com ela e gritei:
- Para de querer mandar em mim, máquina louca, não pode só apontar o dedo em vez de falar? Eu vou se eu quiser, entro à direita se eu quiser! Ninguém manda em mim, muito menos uma máquina tola, maluca que nem sabe falar direito.
A pessoa me olhou espantada pensando que eu iria bater nela, que eu havia surtado e andou mais depressa, fui atrás e me desculpei  falando que havia acabado de jogar a minha máquina de GPS nos trilhos do Metrô e a desgraçada nem assim foi destruída e nem parou de falar.
Caminhei alguns passos ainda ao lado da pessoa que logo avistou uma caçamba de lixo e jogou-a  dentro,  enquanto ela ainda falava e repetia aquelas frases de sempre, acho que deu pane, não parava de falar; “ entre a direita, siga até o final da rua....”
Quando voltei da casa de minha avozinha já haviam levado a caçamba com tudo o que havia dentro.
Agora a máquina maldita deve estar falando sozinha em algum lugar e vai falar muito até acabar a bateria, imagine se encontra a minha?!  As duas vão enlouquecer.
Quanto ao roteiro de ida e volta na casa da minha avó, pretendo comprar uma bussola e um astrolábio e vou me guiar pelas estrelas mesmo, pelo menos eles são aparelhos mudos...


2 comentários:

  1. Hahahahah... engraçado! Gostei dos GPS sofrendo interferência dos celulares...rsrsr

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  2. Muito criativa essa releitura do Chapeuzinho, Clotilde! Parabéns e um grande abraço.

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