terça-feira, 22 de janeiro de 2013

O bilhete de loteria

                                                         O bilhete de loteria
Maria Dalma picou a cebola bem picada até que as lágrimas inundassem o seu rosto magro e pálido, enquanto sobre o fogo a frigideira já aquecia o óleo.
Ela colocou primeiro dois dentes de alho socados e logo em seguida a cebola e as rodelas de linguiça na frigideira e foi mexendo com a colher de pau enquanto o perfume que exalava do alimento se espalhava por toda a casa de poucos cômodos.
Mais um pouco, tampou a frigideira e desligou as panelas de arroz e feijão que estavam prontos assim como a salada de alface e tomates.
Foi até a mesa e estendeu a toalha desbotada e remendada de tantos cortes de faca que os filhos faziam ao cortar o pão diretamente sobre a mesa.
Na mesma hora entraram pela porta da cozinha seu Altamiro que vinha do trabalho e seus três filhos, o Romário, o Raí  e o Ronaldo, chegados da escola.
-Vão lavar as mãos antes de sentar...
Falou Maria Dalma, no automático. Mães têm uma série de frases que já saem automaticamente da boca de tanto educarem os filhos.
Cada um sentou em seu lugar em silêncio e o Seu Altamiro começou a se servir e a estender para os filhos um pouco de tudo o que ele colocava em seu prato.
Em seguida todos em silêncio começaram a comer e assim foi até que finalmente terminaram.
Em seguida Maria Dalma levantou do seu lugar levando os pratos sujos e voltou trazendo algumas laranjas e duas facas com bom corte.
Foi dai que o seu Altamiro comentou:
-Hoje eu joguei na loteria.
-Foi?
-Foi.
Mais um tempo em silencio e continuou;
- Vou ficar rico e vou comprar uma casa bonita e um carro azul.
- Que bom que assim fosse, mas o carro não pode ser preto? Acho tão lindo carro preto...
Falou Maria Dalma um tanto animada
- É claro que não, vai ser azul.
Dai cada filho começou a falar ao mesmo tempo;
- Eu vou sentar na janela atrás do papai...
- Não! Eu é que vou!
-Não, quem vai sentar na janela sou eu!
E os três começaram a bater e dar socos uns nos outros.
- Parem! Parem com isso, desçam todos do carro e vão de castigo para o quarto!

Em seguida o seu Altamiro pegou do bolso o bilhete e achou melhor rasga-lo prevendo que acabaria o seu sossego caso ficasse milionário.

2 comentários:

  1. E talvez o Altamiro tenha sido muito sábio. Não há riqueza maior que paz de espírito...
    Beleza de texto, Clotilde. Um grande abraço.

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  2. Despertou-me a curiosidade, por acaso, a imagem da moça sentada com a vassoura e o balde; assim, cheguei aos Ipês floridos e depois li esses textos do cotidiano narrados de forma agradabilíssima ... Clotilde Fascioni você é uma escritora de mão cheia, não se menospreze!
    É uma pessoa interessante, e voltarei depois para ler outros conteúdos. Abraços. Sra. Leony Lima.

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