Tempos outros
Outro dia de manhã andando pela cidade, passei diante de
uma casa e deparei-me com uma jovem saindo para andar de bicicleta. Até ai nada
de excepcional. Acontece que me chamou a atenção como ela estava vestida para o
evento e horário.
Ela vestia um shortinho rasgado e camiseta de lurex com
tênis. Para quem não sabe, lurex é um
tecido todo cheio de brilhos. Daí meu cérebro deu um rodopio e me lembrei do
tempo em que tinha a idade dela, lá pela década de sessenta, lá pelo meio.
Para começar, uma
jovem mocinha bonita não andava de shorts nem novo e muito menos rasgado pela
rua e nem de bicicleta. Andava de saia rodada, anágua, para quem não sabe, uma
saia branca e com um babado para fazer volume que tanto podia ser de organdi,
de algodão ou outro tecido que pudesse ser devidamente engomado (afff) e a
bicicleta usava uma rede para não enroscar a saia da mulher que se aventurasse
a pedalar. Tênis só para os praticantes de esportes, meus sapatos, sempre de
couro, invariavelmente apertavam em algum lugar.
Roupas de brilho à luz do dia, até a Novela Roque Santeiro e
a criação da Viúva Porcina, personagem da novela com a inigualável Regina Duarte,
era impensável e inadmissível. Brilhos só em festas noturnas. A viúva Porcina
era a encarnação de uma mulher extremamente extravagante em todos os sentidos,
mas principalmente no vestir e se maquiar. Usava tudo de forma exuberante e que
chamasse a atenção de longe. Era de natureza escandalosa e muito divertida. Por
agradar a todos quebrou também certas regras e modismos. Quem fazia o tipo
quebrou paradigmas e a imitou criando uma moda extravagante e discontraída.
Daí, vieram também os abençoados hippies, jovens rebeldes e
contestadores que revolucionaram a forma de se vestir, misturando estampas, materiais
e construindo modelos opostos aos usuais da época, como os vestidos bem
recortados, acinturados, sais justas, na maioria de tecidos escuros e fendas na
parte de trás para facilitar os movimentos, saias plissadas, rodadas e com anáguas, os famosos “taiêr”
(aportuguesando a palavra francesa tailler) que nomeava o conjunto de saia
justa e paletó ajustado, vestido com camisas de laços no pescoço.
Sem falar que quando se falava que era “moda”, todo mundo usava a mesma coisa com pouquíssimas variações. Era um mar de gente vestindo igual.
Sem falar que quando se falava que era “moda”, todo mundo usava a mesma coisa com pouquíssimas variações. Era um mar de gente vestindo igual.
Logo depois, ou na mesma época, sei lá, uma inglesa chamada
Mary Quant acordou um dia injuriada, pegou de uma saia justa que provavelmente
não gostava, ou estava de TPM, sei lá, e passou a tesoura na saia 20 cm acima do joelho
e foi para a rua vestida assim para escândalo geral.
Na mesma semana a
mulherada inglesa (menos a Rainha) e depois o mundo, mesmo sem Face book,
aderiu à moda. E até hoje a maioria das
mulheres teve ou ainda tem pelo menos uma minissaia no armário.
Provavelmente hoje em dia, quase ninguém sabe quem foi Mary
Quant, mas a idéia dela permanece até hoje nos melhores e piores corpos femininos
da face da terra.
Mas voltando à minha juventude, eu usava muito, uns vestidos
chamados “tubinhos”; chamados assim por serem inteiros como tubos, levemente acinturados
e iam até logo abaixo dos joelhos. Sim, essa era a medida, eu não aderi à minissaia por restrição da minha mãe que não apreciava "essas modernidades".
Para completar e infernizar a minha vida mais um pouco eu também
usava meias de Nylon, ou de seda, como também eram conhecidas aquelas meias que
dividiam com um risco de cima a baixo as batatas das pernas e puxavam fio de
cima abaixo ao se respirar mais profundamente, ou se falar mais alto,
constrangendo as mais vaidosas. E o pior, elas eram usadas nas quatro estações do ano para meu desespero, não esquentavam no frio e superaqueciam no verão.
Para segura-las no alto das coxas se usava umas ligas de elásticos
que ou eram frouxas ou apertadas demais, ou ainda, uma mais apertada do que a
outra dando a sensação de descer perna abaixo a qualquer momento, o que fazia descompensar o cérebro, enquanto caminhava.
Também tinha a cinta liga que eu também não gostava, pois me
sentia com arreios. Não sabia se usava por cima ou por baixo da calcinha, que
sensação horrorosa aquelas coisas todas amarradas ao corpo.
Depois vieram e ainda estão por ai as meias calça, que também
não gosto de usar, aliais hoje só uso o que gosto e que se dane o mundo.
E esses usos eram coletivos, todos se vestiam da mesma forma
com leves variações do mesmo tema, como os tecidos de renda, linho ou seda. Um babado aqui, uma
lapela maior ou menor, um cinto mais largo ou mais fino, laços e fitas de
veludo em profusão. Outro adereço eram as luvinhas usadas até com o termômetro marcando 40°. As luvas também eram usadas em qualquer estação do ano para compor o traje em muitas
ocasiões, até para assistir a uma simples peça de teatro ou qualquer festa mais formal, sempre
acompanhadas de carteiras como eram chamadas aquelas bolsas retangulares sem
alças que não se sabia direito como carregar e que agora voltaram a usar.
Me lembrei também caminhando pela rua debaixo do sol, que sempre gostei de brincos e meu pai
nunca permitiu que eu furasse as orelhas, dai eu usava uns brincos de pressão
desgraçados de doloridos, com pressões diferentes, um apertava mais que o
outro, chegava a dar dor de cabeça. Duvido
que a maioria que usava aqueles brincos não voltava para casa com eles na
bolsa, por que chegava uma hora que ou arrancava os brincos, ou arrancava as
orelhas. Também eram coisas de antigamente que Graças aos deuses não existem
mais. E viva o agora!
Dai passei a adorar a revolução dos Hippies, pois graças a
eles hoje se usa simplesmente TUDO, o que você estiver a fim de usar. Tudo é
bonito e “combina com tudo”, não se usa nada que seja desconfortável, tudo é
folgado e macio, não aperta e não pinica.
Tudo está na moda e cai bem, desde que você tenha
autoconfiança até de sair por ai com chapéu roxo enfeitado com ninho de passarinhos,
se der na telha, é claro! ...
Eu sei, eu não era fácil. Era? hahahah