quarta-feira, 27 de julho de 2011

Sonho de Consumo


Aproveitando que estamos a beira de mais uma data "festiva" (daquelas que eu adoro) em que o comércio fatura um pouco mais, aproveitando a compulsão quase irracional de algumas pessoas que "não podem" deixar de dar um presente OBRIGATÓRIO, impulsionado pela lavagem cerebral. O tempo todo a televisão exibe  vitrines chamativas por toda parte, lembrando a todos que em algum lugar existe um pai que nos fez, ou criou e que temos OBRIGAÇÃO de dar-lhe um presente no segundo domingo de agosto. É mole?
Pois é dai me lembrei deste post de 2009, que me comove muito e relembro sempre.
 A importância de uma porta.
Certa vez, assistindo o Jornal Nacional, me comovi ao me deparar com a triste situação de alguns moradores de rua que foram entrevistados por uma jornalista. Tudo bem, de vez em quando vemos esta matéria que a bem da verdade nem nos causa tanta dor quanto deveria, de tão repetida. Infelizmente, a gente acostuma, e não devia. Mas como dizia, nada de estranho não fosse a batida matéria tratando as pessoas "gente", com perguntas tolas e sem sentido como sempre. Mas nesse dia especialmente, fiquei sensibilizada. A jovem jornalista foi até um "amontoado de coisas de todo tipo" em baixo de um enorme viaduto e entrevistou uma pobre família composta de marido, mulher e uma menininha de uns 4 anos muito bem cuidada e limpa, diga-se de passagem. A mulher franzina e humilde, sem fazer idéia o que é decoração ou coisa parecida, por motivos obvios, conseguiu arrumar seus miseráveis pertences de forma harmônica e prática. Aproveitando os diversos tapetes que arrecadou pela cidade, estendeu-os lado a lado sob a insensivel e concreta ponte, fazendo "cômodos" sobre cada um estabelecendo naquele exíguo espaço uma planta baixa onde de acordo com o mobiliário estavam dispostos cada ambiente. No "quarto do casal" uma cama acomodava um colchão antigo de molas e vários restos de mantas e cobertores de todo o tipo esticados uns sobre outros, e nas laterais caixotes acomodavam as roupas dobradas, talvez até de marcas famosas que ganhavam pela cidade. Mais ao lado, um tapete delimitava o "espaço" da filhinha, onde dormia plácidamente num berço cor de rosa entre bonecos de pelúcia, "levemente" descorados e faltando alguns membros , olhos etc. Do outro lado, um velho móvel guardava umas latas de achocolatado e leite em pó com comidas secas e bolachas, que ela fez questão de mostrar e até oferecer docemente  à entrevistadora. Sobre dois blocos de concreto, um fogãozinho de duas bocas todo retorcido "acomodava" uma panela enegrecida de tanto ser usada para cozer algum alimento. Dava pena e ao mesmo tempo admiração ver tanta obstinação em viver com dignidade em tão difíceis circunstâncias e principalmente da melhor forma com o que tinha ou arrecadavam. Mas o que mais me surpreendeu mesmo foi o diálogo da jornalista com a mulher; 
- Como a senhora consegue morar aqui neste lugar com todo esse barulho?
-Fazer o que né? A gente faz o que pode... 
-E qual é o seu maior sonho, o seu maior desejo? (Sempre a pergunta idiota, mas isso não importa agora).
-Eu sonho em ter um barraquinho meu, eu até imagino no final do dia, quando vai anoitecendo eu vou até a janela e fecho, vou até a porta e fecho. A minha maior alegria é ter uma porta para fechar e abrir...
Alguém faz idéia do que é viver sem portas e janelas para se proteger? 
E você? Qual é o seu sonho de consumo?


Só a titulo de curiosidade,  esta foto é de um piano todo feito de flores participante de uma festa na Europa, que infelizmente não lembro o nome.




2 comentários:

  1. ... é querida escritora e vivente de uma disparidade social sem limites! Inacreditável, mas real... Abrir nossas janelas e portas e depararmo-nos com sobreviventes de rua... sem as mínimas condições de NADA... é revoltante!! E, ainda reclamamos de nossas vidas! Abrs. Célia.

    Indico o blog abaixo:

    http://laurodaros.blogspot.com

    Esse é um blog que também vale ser visitado, comentado e seguido!

    ResponderExcluir
  2. Obrigada pela visita Celia, vou aceitar a sua indicação, sim.

    ResponderExcluir