A partir do momento que tomei a decisão não parei
mais de olhar o relógio e daí que o tempo passou a andar mais devagar. O final
do expediente estava próximo.
Peguei a minha grande bolsa e enfiei a mão naquele
precipício de variedades e toquei em algo firme e liso e agarrei-o decidida. Era
o meu batom. Destampei-o com habilidade levei-o aos lábios no espelho do
elevador antes que ele se abrisse no térreo. Sai à passos largos, apressada e
desviando dos que vinham em minha direção, como se estivesse sendo perseguida
por alguém que pretendesse tirar minha vida. Cheguei esbaforida no Metrô, desci
os degraus aos pulinhos com o coração disparado no peito, feliz como uma
criança. Toda emoção! Olhei o relógio e
constatei que faltavam poucos minutos.
pouco depois o metrô parou na minha estação e um mar de pessoas
que saia foi ao encontro dos que chegavam dificultando o caminhar. Acelerei os
passos em direção à saída, mas precisei ir em zigzag, pois tudo me parecia
lento, quase parando e eu tinha pressa, muita pressa!
Finalmente saí lá fora e o farol de um carro me
atingiu os olhos me deixando cega por alguns segundos, mas nem isso me desviou
a intenção. Virei à direita no final do quarteirão e atravessei a rua tomando a
direção do Shopping onde entrei como um furacão, toda afogueada de
ansiedade. Andei até a praça principal e tomei o elevador que por sorte chegava
naquela hora. Entrei e apertei o último botão respirando fundo.
Finalmente cheguei ao balcão e comprei a entrada. A
sessão já ia começar. Sentei e me envolvi na penumbra fresca me deleitando numa
satisfação intima difícil de explicar.
Como pode uma sala de cinema exercer tamanho prazer
a alguém? Era um relaxamento total ao mesmo tempo uma excitação de curiosidade,
uma adrenalina, que por alguns momentos deixamos de ser nós mesmos para sermos
alguém num corpo estranho? A curiosidade por uma nova história, uma nova
viagem, uns minutos que nos levam à fantasia, o sonho, com se entrássemos numa nave do tempo sem
medidas, sem tempo e espaço, totalmente em suspensão.
É pena que esses momentos únicos têm um fim, um “The
end”, e quando as luzes se acendem o encantamento termina, ainda
gostaríamos de ficar mais um pouco lembrando das cenas mais marcantes, os
efeitos especiais, a fotografia, embalados pelas músicas inesquecíveis,
serenas ou violentas.
Mas sempre é preciso sair dali e voltar à realidade,
deixar aquele ambiente mágico, mesmo que seja para voltar para casa e ler um
livro, para continuar viajando virtualmente.
O mais interessante é que por mais emoções que estes
momentos nos causem, nossa mente seletiva pode apagar a história dias depois ou
mesmo horas depois, nos deixando a dúvida se vimos ou não aquele filme, não é
muito louco isso?
Assim fica mais leve continuar vivendo...
Clotilde, este seu ótimo texto me fez lembrar do filme "A Rosa Púrpura do Cairo". Obra extraordinária do Woody Allen, que ele mesmo considera o seu melhor filme. Se ainda não viu, é absolutamente obrigatório. Um dos roteiros mais originais da história do cinema. A heroína da história é muito parecida com a protagonista do seu texto. Abraços e boa semana!
ResponderExcluirNão assisti não Marcelo, vou procurar, obrigada.
ResponderExcluirMas nem sempre, Clotilde... Certa vez, ainda jovem, fui ver o filme brasileiro "Deus e o Diabo na Terra do Sol". Com dez minutos de projeção levantei-me e fui embora. Tinha mais o que fazer... Nem o escurinho e ar condicionado perfeito me fizeram ficar.
ResponderExcluir