quinta-feira, 15 de julho de 2010

Lembranças

Quando eu era jovem e já faz muito tempo, eu copiava poesias em cadernos e cadernos, que guardei até muito anos depois de casada.
Até me lembro o dia que botei fogo neles e numa sacola de cadernos e livros de receitas, num ato de ira total por conta de uma dessas discussões tolas do dia a dia entre duas pessoas casadas por muitos anos. Enquanto o fogo ardia as páginas amarelecidadas pelo tempo e pelos pingos de gordura (os da cozinha), eu queimava junto a minha juventude, as minhas receitas preferidas que fazia com prazer para os filhos. Me lembro de rasgar cada uma das páginas dos cinco cadernos, sim eram cinco cadernos de poesias copiadas em letra rebuscada e sem erros nem borrões. "Como sou boba", eu pensava, enquanto lágrimas de puro sofrimento e tristeza rolavam pelo rosto. Meu marido era uma boa pessoa, mas de romântico não tinha nada, ou pelo menos sempre menosprezou versos e poemas, musicas especiais do casal, aquelas coisas da juventude, e até implicava com estes cadernos quando remexia nas minhas coisas. O seu lado romântico, de que me lembro, e até me comove ainda, era colocar uma florzinha do jardim, apanhada e colocada num copo com metade de água, no lugar que eu sentava para tomar o meu café da manhã, quase todas as manhãs, já que ele era madrugador e eu não, entre muitas outras diferenças. Isso ele fez sempre que pode ou tinha flores no jardim, para me agradar até dias antes de morrer.

Mas voltando às poesias que sempre me encantaram na juventude, esta semana com surpresa e alegria recebi de uma amiga, amigona mesmo, daquelas que tem uma poltrona especial, bem fofa, no meu coração, a Ivone Alencar, uma delicada poesia. Ela me encontrou na Internet e me escreveu. Dias depois me enviou uma poesia que ela diz que escrevi no "caderno de lembranças", que era outra coisa, muito especial da época; Era um caderno de capa grossa e decorada, onde entregávamos para que os amigos ali deixassem suas lembranças e o dela ainda existe, o meu ainda preciso achar pois ainda tenho pelo menos umas 15 caixas fechadas da mudança, com coisas "que nem quis olhar". Se ele sobreviveu a todas essas mudanças deve estar guardado ainda, mas meu coração guarda mais que palavras escritas, guarda palavras ouvidas, carinho e ainda boas e gostosas risadas de pura ingenuidade.
Como era-mos ingênuas e sonhadoras....
Agora relendo o poema de Paulo Setúbal, vejo quanto a vida mudou, quanto a juventude se tornou dura e crua, sem sentimentos e ingenuidade, que passa a não existir desde o berço.
Que pena...restam as lembranças puras e o reencontro com os queridos e velhos (literalmente) amigos, que não nos esqueceram, e que trazem uma saudade que chega a doer....





Sob um pessegueiro

Foi pelo tempo alegre da moenda.
Quando aos quinze anos, tudo nos sorria
Que nós tecemos, juntos, na fazenda
Toda uma história de infantil poesia.


E sob um pessegueiro, amplo e robusto.
Cheio de frutos e de passarinhos
Foi que nós ambos pálidos de susto
Nos encontramos certa vez sozinhos.


Tão confuso, tão tímidos ficamos
Ao vermos-nos juntinhos no pomar.
Que nós, olhando os pêssegos nos ramos.
Nem, tínhamos coragem de falar.


Mas de repente que ventura louca
Ela sorria-me, tremula de pejo
E eu lhe furtei da pequenina boca
Um pequenino e delicioso beijo


Foi desde então que na minha alma eu trouxe
Como lembrança deste amor fagueiro
Esse beijinho estaladinho e doce
Que nós trocamos sob o pessegueiro.

4 comentários:

  1. ...ahh kerida Clo...me emocionei com suas palavras...um pedacinho da sua vida ...descrita aki e ke me causou tanta emoção...ah como me doeu ler *** enquanto lágrimas de puro sofrimento e tristeza rolavam pelo rosto***...eu me vi junto a tua fogueira...e vi td se queimando e doeu demais em mim...pq revi a cena de um dia ter ke desfazer de coisas ke um dia escrevi...de ter ke jogar uma parte da minha história no esquecimento...sei ke td passa....(só Deus naum passa..naum é mesmo?)...mas doi sim se desfazer do ke um dia nos pertenceu...o tempo ke se perdeu...a emoção dakele momento....cada palavra ...cada pontuação....ah desculpa ae o desabafo ...tomei tuas dores...afff....como vc mesmo diz...meu humor sarcástico e irreverente (instável ultimamente pela idade).essa foi demaisss rsrrsrs....naum sabia ke era por isso ke eu tava passando....hsauuasuauhss....qto ao carinho do seu **amado**...lhe ofertando flores...isso realmente me fascinou...bjão minha linda....fika na paz!!! Liih

    ResponderExcluir
  2. Obrigada pela visita, querida. Apareça sempre, é um prazer muito grande saber que você está pensando em mim e por conta disso ficamos mais próximas, nénão? Bjs♥

    ResponderExcluir
  3. Gostei muito deste artigo,é uma parte de ti,é voce ai,sou eu aqui,que um dia fiz a mesma coisa e senti a dor é uma dor que fere a alma e corta a carne...lutei muito pra esquecer aquele dia,hoje relembrando com o seu conto...Quanto a oferenda de flore,...que coisa sublime,que lindo!!!beijos minha querida."a noite passada eu sonhei com voce"

    ResponderExcluir
  4. Clotilde, me emocionei lendo a sua biografia de vida muito parecida com a minha.Vinha proucurando a muitos anos uma poesia da minha juventude , que também como você queimei em uma fogueira o meu caderno com poesias fotografias e dedicatorias
    Fiquei sabendo agora que o noem è sob um pessegueiro de Paulo Setúbal.
    Procuro também uma poesia , não sei o titulo que termina assim SOU CEGUINHA MAS TENHO UM CORAÇÃO QUE PRA TE AMAR FOI TALVEZ POBRE PRA TE QUERER FOI MUITO NOBRE MAS NÃO PRECISA DA SUA COMPAIXÃO, mais ou menos isso, você conhece?
    adorei tudo que vc escreveu, tenho 77 anos sou mineira moro em Brasilia a mais de 30 anos.
    Também pinto, bordo dou aulas de pintura gosto de escrever e ler poesias, também danço tango de cenário.
    Tenho 6 filhos 9 netos sou casada mas, apenas dividimos um apto. vivemos cordialmente.
    Adorei ler você! meu e-mail therezinhabraga@yahoo.com.br se quiser escreva-me beijos therezinha

    ResponderExcluir